Hérnia Discal Cervical

“Dra., o meu cão começou a andar devagar e parece que tem dificuldade em movimentar as patinhas da frente. Às vezes chora e gane quando quer comer. Também tentou morder-me quando lhe toquei no pescoço. Se calhar pulou e magoou-se…”.
 
Já ouvi muitos relatos semelhantes durante a consulta e normalmente a minha suspeita recai sobre as hérnias cervicais. Mas o que é uma hérnia cervical?
 
Bem, na verdade estamos perante a Doença do Disco Intervertebral, talvez a causa mais comum das doenças neurológicas nos cães, sendo que aproximadamente 20% são na região cervical.
 
Entre cada vértebra existe um disco intervertebral e este basicamente funciona como uma “almofada”. O disco é uma estrutura constituída externamente por uma parte fibrosa, chamado anel fibroso, e por uma parte interna gelatinosa, o núcleo pulposo. Às vezes o disco perde a sua flexibilidade tornando-o mais “seco” e acontece a extrusão, ou seja, a “saída” da parte interna através do anel fibroso, são as hérnias de Hansen do Tipo I. Normalmente são mais agudas, típicas dos cães jovens (menos de 3/5 anos), de raças condrodistróficas ou seus cruzamentos.
 
Existem hérnias onde não ocorre rompimento do anel fibroso, mas sim uma protusão, essas são as hérnias de Hansen tipo II. Neste caso, a compressão medular é gradual e progressiva. Normalmente afecta cães de meia-idade (após os 7/8 anos) resultando mudanças da matéria branca medular (desmielinação, malácia focal, vacuolização e perda de axónios.
 
As raças mais predispostas às hérnias de Hansen do tipo I são as condrodistróficas, como o Basset Hound (já viram as patinhas tortinhas de um Basset?), o Teckel (Dachshund), o Corgi Esses cães possuem a coluna muito comprida, as patas curtas e tortas e a cabeça grande, sendo que suas vértebras também podem estar deformadas o que predispõe à degeneração do disco intervertebral. Outras raças como o Beagle, o Caniche, o Shi Tzu e o Pequinês também são mais predispostas.
 
Outras raças, apesar de não serem condrodistróficas (ou com tendência à condrodistróficas) que possuem maior predisposição à doença do disco intervertebral são o Pastor alemão, Labrador e Dobermann, mas nestas raças a hérnia de Hansen tipo II é a mais comum.
 
Mas e os gatos? Sim, os gatos também podem sofrer algum tipo de compressão na medula, mas normalmente está associado a fatores traumáticos, como no caso dos atropelamentos e quedas.
 
Mas quais são os sinais e sintomas mais comuns?
– Dor na região cervical (normalmente é o primeiro sinal)
– Andar devagar
– Cabeça baixa e com pescoço rígido
– “Fraqueza” (ataxia, paresia e tetraparesia e tetraplegia) dos membros torácicos (patinhas da frente) e às vezes dos 4 membros (frente e trás).
 
Mas algumas doenças possuem sinais e sintomas muito semelhantes, como:
– Neoplasias
– Síndrome de Wobbler (espondilomielopatia cervical caudal)
– Meningite
– Instabilidade atlanto-axial (primeiras vértebras cervicais)
– Discoespondilite
– Divertículos aracnóides
 
Por isso, um bom diagnóstico é importante, sendo a consulta neurológica fundamental, para além da realização de alguns exames, como o RX cervical, Bioquímicas sanguíneas, análise do líquido céfaloraquidiano (LCR), para descartarmos agentes infecciosos (como na meningite). A Ressonância Magnética (RM) é o exame por imagem considerado ideal, e na impossibilidade deste, a TAC (tomografia axial computadorizada).
 
Existe tratamento?
Sim, sendo que este inclui terapia medicamentosa conservadora (anti-inflamatórios, analgésicos), cirúrgica (Fenestração “ventral slot”, Laminectomia dorsal, Distracção fusão vertebral), acupuntura e fisioterapia. O sucesso dessas terapias vai depender de alguns fatores, como os sinais apresentados pelo animal:
– Dor cervical com irradiação para os membros torácicos: BOM prognóstico
– Dor cervical com paresia dos membros torácicos e pélvicos e diminuição da propriocepção: prognóstico BOM/ RESERVADO
– Dor cervical e animal tetraplégico: prognóstico RESERVADO/DESFAVORÁVEL
 
A acupuntura tem sido utilizada com muito sucesso, tanto em casos agudos como nos crónicos. Ela actua aliviando a dor, relaxa os espasmos e contraturas musculares (trigger points), aumenta a excitabilidade dos nervos, estimulando assim as funções neurológicas.
 
Portanto, para os que possuem animais das raças mais predispostas ou seus cruzamentos, fiquem atentos! O tratamento existe, mas o segredo é não deixar que o processo se “arraste”. Leve o seu cão/gato ao veterinário o mais depressa possível se observar algum ou alguns dos sintomas descritos.

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